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Os imigrantes, em suas raízes comuns

  • encontraponto
  • 23 de jun.
  • 2 min de leitura

Eduardo Stotz


Com a ascensão da extrema-direita ao governo democrático-burguês dos EUA o nacionalismo volta à cena, inclusive na xenofobia contra os imigrantes, aqueles que sempre sofreram brutal exploração, sem contrato assinado e salários abaixo do permitido, sob o jugo de capatazes ou supervisores cruéis.


O comportamento governamental da potência hegemônica do imperialismo disseminou-se a outros países, como Portugal, onde a coalizão de direita eleita no mês passado (Aliança Democrática) impôs a expulsão de aproximadamente 34 mil imigrantes, dando-se o prazo de 20 dias para se retirarem do território português. Aqueles que não cumprirem o prazo serão submetidos a "afastamento coercivo", segundo o governo (BBC News, 8 de junho de 2025).


O texto a seguir é uma reprodução do capítulo final da obra “O tempo no Planetário e outros ensaios”, de minha autoria (2008). Pode ser lido como um contraponto à onda reacionária contra os imigrantes, ao trazer para o conhecimento dos trabalhadores atuais as suas raízes comuns.



Observar, entender


Em novembro de 1980, uma equipe da Carta Arqueológica do Algarve identificou um extenso povoado num lugar denominado Vale  do Boto. Apesar da indiferença oficial, os arqueólogos conseguiram recursos mínimos e o adiamento, por um ano, do plantio da vinha que, por meio da destruição de um secular olival e da remoção de centenas de pedras emparelhadas e fragmentos de cerâmica, conduzira à descoberta.  As escavações e os estudos permitiram salvar para a História estes traços fósseis no sítio do Vale do Boto, em Olhos de São Bartolomeu de Castro Marim, traços identificados como de origem árabe-medieval. 


Dentre as conclusões, vale a pena destacar a suposição de ter havido uma ocupação centrada em pleno período muçulmano, entre os séculos  IX e XI, época do califado e das taifas. Referem-se os pesquisadores,  ainda, à extrema pobreza desta ocupação. Contra a opinião de alguns, seria necessário prosseguir os trabalhos. Eles afirmaram, em apoio a esta  assertiva: 


É que, mais que as opulentas cidades, onde cresceu e se extinguiu uma brilhante civilização, nos interessam esses humildes lugarejos, onde se forjou toda uma história agrária que está na gênese da nossa própria


Em apêndice ao artigo [1], os arqueólogos fazem ainda referência a uma história recolhida entre trabalhadores rurais e pescadores da região,  a um primeiro olhar pouco crível, mas de registro indispensável, repassada a eles por intermédio de Augusto Cavaco, proprietário do Vale do Boto, entretanto falecido; versões idênticas foram posteriormente recolhidas.  A história é a seguinte: 


Trabalhadores portugueses que haviam migrado para Marrocos, ao se identificarem como provenientes da região do Vale do Boto, em Castro Marim, ouviram repetidas vezes os marroquinos lhes dizerem ser  aquele o lugar de uma das suas antigas cidades, de onde, em épocas remotas, teriam fugido, perseguidos pelos cristãos. A frequência com que ouvimos esta história ser contada, por pessoas sem qualquer contato entre si, justifica  que a mencionemos.  



[1] Helena Catarino, Ana Margarida Arruda e Victor Gonçalves. Vale do Boto: escavações de 1981 no complexo árabe/medieval. Clio – Revista do Centro de História da Universidade de Lisboa, vol.3, 1981.


Imagem de capa: Terra

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