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IA /Automação: é diferente desta vez?

Nossa publicação começa pela análise do evento midiático dos 70 anos da Volkswagen, comemorados no vídeo comercial de dois minutos encenado por Maria Rita com a imagem da mãe, Elis Regina, produzida por IA sob encomenda. O “encontro” entre mãe e filha no comercial de lançamento de uma nova Kombi utilizou a música Como nossos pais, de Belchior, cantada por Elis em 1976. De uma canção de protesto da geração estudantil da classe média de 1968 – que assistiu à consolidação da ditadura militar, a qual garantiu a exploração da força de trabalho por empresas como a Volkswagen – transforma-se, nas mãos da equipe midiática, graças ao uso da IA, numa emocionante lembrança... dos automóveis de antigamente, pertencentes aos pais e avós das gerações atuais.


Sintomaticamente a reprodução da música de Belchior na voz de Elis Regina omite a passagem “Por isso, cuidado, meu bem/ há perigo na esquina/ eles venceram e o sinal está fechado pra nós/ que somos jovens”, substituída por outra parte da canção: “Você me pergunta pela minha paixão/ digo que estou encantada como uma nova invenção/ eu sei de tudo na ferida/ do meu coração”.


Em poucos dias, milhares de visualizações, a favor (maioria) e contra (minoria), tomaram conta das redes sociais. A propaganda foi um sucesso porque conseguiu manipular a “memória afetiva” de avós, pais e filhos que passavam juntos finais de semana e feriados graças à “mobilidade urbana” viabilizada pelo automóvel. Obviamente, uma memória da pequena burguesia. Os assalariados, que não tinham acesso a esse tipo de bem, organizavam-se para fretar ônibus e se divertir juntos em viagens de curto alcance.


A propaganda da Volkswagen/Maria Rita reforça uma representação comum a multidões de pessoas anônimas. Quer dizer, ao sentimento de coparticipação de um evento comemorativo “transportado” do presente ao passado e de volta ao futuro proporcionado pelo comercial, que funciona, portanto, como um vetor: “Volkswagen – 70 anos de sucesso que passa de geração em geração”.


O que se discutiu, na contramão da “memória afetiva” do “clássico do futuro”, foi a manipulação do conteúdo, o interesse de Maria Rita de faturar em cima da imagem falsificada da mãe, que jamais falou em favor da Volkswagen etc. A contrapartida da crítica pode ser simplesmente afirmar o direito de se expressar e de se criar sua própria versão dos fatos, inclusive na forma de ficção, ainda que com intuito de ganhar dinheiro. Afinal, não vivemos numa “sociedade livre”?


Superar tal ideologia em primeiro passo, isto é, nesse campo, significa tomar distância e exercer a crítica. Denunciar a apropriação capitalista da IA genérica para aumentar a exploração e a opressão por todo o lado, inclusive mediante a manipulação midiática. Tal iniciativa, porém, tem o mesmo sentido do trabalho educativo, de atingir quem pode ser atingido, a saber, a minoria (por enquanto) interessada em descobrir o caminho de saída desse mundo “de segunda mão” em acelerada recriação pelas Big Techs e seus servidores do Vale do Silício.


Uma contribuição inicial para a crítica da apropriação capitalista da IA é apresentada, a seguir, no texto de Judy Wajcman intitulado Automação: é diferente desta vez?, publicado no dossiê “Digitalização do trabalho”, da Fundação Rosa Luxemburg.


Ainda que se refira a um conjunto de publicações relativas ao ano de 2019, a resenha assinala as tendências na literatura, ajudando a assumir uma perspectiva política geral crítica sobre o uso da IA e a estimular a pesquisa bibliográfica.


A limitação do texto de Judy Wajcman é a de não mencionar a importância da luta dos trabalhadores para a superação da ordem social baseada no capitalismo, tal como apontado na publicação anterior. A efetiva desconstrução da ideologia burguesa que molda a vida social somente pode acontecer como resultado dessa luta, na perspectiva de que, como assinalou Florestan Fernandes em “Circuito fechado” (1977), a história nunca se fecha por si mesma e nunca se fecha para sempre. São os homens, em grupos e confrontando-se como classes em conflito, que “fecham” ou “abrem” os circuitos da história.


Acesse aqui o texto traduzido e boa leitura!

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